Ração contaminada mata 645 cavalos e expõe fragilidade na fiscalização agropecuária no Brasil
Animais morreram após comer ração da Nutratta; episódio reforça alerta do Anffa Sindical sobre riscos do autocontrole e da falta de fiscais
A morte de 645 cavalos em seis estados brasileiros, causada pelo consumo de ração contaminada da empresa Nutratta Nutrição Animal Ltda., acendeu um alerta sobre as fragilidades na fiscalização agropecuária no país. O caso, que envolve a toxina monocrotalina, encontrada em plantas do gênero Crotalaria, trouxe à tona preocupações do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Anffa Sindical) com o modelo de autocontrole e a insuficiência de profissionais para inspeções.
A tragédia, que gerou prejuízos econômicos, emocionais e genéticos, também levanta questionamentos sobre os riscos de mudanças propostas pelo governo, como a privatização das inspeções ante mortem e post mortem de animais destinados ao consumo humano.
A tragédia e seus impactos
As mortes, registradas entre abril e julho de 2025, ocorreram nos estados de São Paulo (287), Rio de Janeiro (69), Alagoas (65), Goiás (4), Minas Gerais (41) e Bahia (40), conforme levantamento da advogada Maria Alessandra Agarussi, que representa criadores afetados e coordena o grupo “Vítimas da Nutratta” no WhatsApp.
Os equinos apresentaram sintomas graves, como desorientação, agressividade súbita, dificuldade de locomoção e comportamentos semelhantes à demência, causados pela monocrotalina, uma substância que provoca insuficiência hepática e danos neurológicos irreversíveis. Além de cavalos, há relatos de adoecimento de suínos, bovinos e cães, indicando que a contaminação pode ter impactos ainda mais amplos.
Um caso emblemático é o do garanhão mangalarga marchador Quantum de Alcatéia, avaliado em R$ 12 milhões, cuja morte gerou perdas estimadas em R$ 30 milhões, incluindo lucros cessantes. Em Indaiatuba (SP), um rancho relatou prejuízos de R$ 2 milhões com a morte de 35 cavalos, considerando custos com animais, medicamentos e atendimento veterinário. “O caso é gravíssimo. Nunca na história deste país aconteceu uma contaminação desta magnitude”, destacou Agarussi ao portal Metrópoles.
Resposta do Ministério da Agricultura
O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) confirmou 222 mortes de equinos até 3 de julho de 2025, com 195 casos adicionais sob investigação. As primeiras denúncias foram recebidas em 26 de maio, desencadeando fiscalizações na fábrica da Nutratta em Itumbiara (GO). Durante duas inspeções, o Mapa identificou irregularidades que levaram à suspensão cautelar da produção e comercialização de todos os produtos da empresa. Em 17 de junho, o ministério determinou o recolhimento de rações para equídeos fabricadas a partir de 21 de novembro de 2024, após laudos preliminares confirmarem a presença de monocrotalina no produto Foragge Horse.
A Nutratta, por sua vez, nega a totalidade das mortes associadas à sua ração e afirma colaborar com as investigações, adotando medidas como reforço nas análises laboratoriais e revisão de protocolos de fornecedores. A empresa conseguiu uma liminar judicial para retomar a produção de produtos não destinados a equinos, mas a comercialização de rações para cavalos permanece suspensa. O Mapa, que aguarda decisão judicial após a empresa impetrar um mandado de segurança, reforçou a importância de denúncias formais via ouvidoria (www.gov.br/ouvidorias) (www.gov.br/ouvidorias) para mapear a extensão do problema.
O alerta do Anffa Sindical
O Anffa Sindical aponta que o caso expõe os riscos do modelo de autocontrole, em que empresas assumem parte da responsabilidade pela fiscalização de seus próprios processos. “É uma missão de Estado que não pode ser delegada a terceiros, sob pena de causar prejuízos vultuosos para o país”, afirmou Janus Pablo Macedo, presidente do sindicato. Ele destaca que a falta de auditores fiscais agropecuários e a baixa frequência de inspeções agravam a situação. “Nosso setor de fiscalização já passa por uma situação difícil por falta de servidores. E o horizonte, com a proposta de privatização das inspeções, pode piorar ainda mais”, alertou.
A proposta do governo de permitir que frigoríficos contratem empresas privadas para realizar inspeções ante mortem e post mortem de animais destinados ao abate é vista como um risco à saúde pública e à credibilidade do Brasil como exportador. “O risco de conflito de interesse é elevado, e a saúde da população, seriamente ameaçada”, enfatizou Macedo.
O Anffa Sindical argumenta que a terceirização pode comprometer a qualidade dos alimentos e a confiança de mercados internacionais, em um momento em que o Brasil busca consolidar sua posição no comércio global.Consequências econômicas e regulatórias
Além dos prejuízos financeiros, que incluem desde a perda de animais de alto valor até gastos com tratamentos, a tragédia abalou a confiança na indústria de rações. O caso pode levar a mudanças regulatórias, com o Mapa considerando normas mais rígidas para a produção e comercialização de rações. A Promotoria de Justiça do Consumidor de São Paulo abriu uma investigação preliminar para apurar responsabilidades, notificando a Nutratta e órgãos como o Conselho Regional de Medicina Veterinária.
Criadores afetados, organizados em grupos como “Vítimas da Nutratta”, buscam reparação por danos materiais e morais, já que muitos cavalos tinham valor afetivo, sendo usados em terapias ou competições. A advogada Agarussi reforça a importância de registrar denúncias no Mapa para que o número real de óbitos seja contabilizado e as investigações avancem.
Um chamado por mais fiscalização
A tragédia com a ração da Nutratta evidencia a necessidade de um sistema de fiscalização agropecuária robusto e independente. O Anffa Sindical defende que a proteção da saúde animal e humana depende de auditores fiscais capacitados e de uma estrutura estatal que evite conflitos de interesse. Enquanto as investigações seguem, o caso serve como um alerta para os riscos de afrouxar as regras de inspeção, especialmente em um setor vital para a economia e a segurança alimentar do Brasil.
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