Operação Spare desmantela rede de lavagem de dinheiro do PCC em motéis e postos de combustíveis
Investigação revela esquema bilionário que movimentou R$ 1 bilhão em estabelecimentos de fachada, com bens de luxo como helicópteros e iates – entenda como o crime organizado se infiltrou na economia

A Receita Federal e o Ministério Público de São Paulo (MP-SP), por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), deflagraram nesta quinta-feira a Operação Spare, um desdobramento da Operação Carbono Oculto, que expõe a sofisticação com que o Primeiro Comando da Capital (PCC) infiltrou setores legítimos da economia para lavar dinheiro oriundo do crime organizado.
A ação, que cumpriu 25 mandados de busca e apreensão em cidades como São Paulo (19 mandados), Santo André (2 mandados), Barueri, Bertioga, Campos do Jordão e Osasco, mira um esquema que envolveu postos de combustíveis adulterados, exploração de jogos de azar e uma rede de cerca de 60 motéis registrados em nomes de laranjas.
Esses estabelecimentos movimentaram mais de R$ 450 milhões entre 2020 e 2024, contribuindo para o aumento patrimonial de sócios do crime organizado por meio da distribuição de R$ 45 milhões em lucros e dividendos.
De acordo com as investigações, o principal operador do esquema é o empresário Flávio Silvério Siqueira, conhecido como Flavinho, suspeito há anos de lavar recursos ilícitos via postos de combustíveis. Ligado a uma extensa rede de 267 postos ativos, que movimentaram R$ 4,5 bilhões no período analisado, mas recolheram apenas R$ 4,5 milhões em tributos federais – equivalente a 0,1% do total, bem abaixo da média do setor –, Flavinho é apontado como o comandante do núcleo central.
A Receita Federal identificou que ele controlava formalmente cerca de 400 postos, com 200 diretamente vinculados a ele ou associados, utilizando Sociedades em Conta de Participação (SCP) para reinvestir os recursos lavados em imóveis, negócios e ativos de luxo. Além dos postos, o grupo operava em empreendimentos imobiliários, lojas de franquias e motéis, que serviam como “buracos negros” para a ocultação de patrimônio. Foram identificados 21 CNPJs ligados a 98 estabelecimentos de uma mesma franquia de perfumaria, todos em nomes de alvos da operação, que movimentaram cerca de R$ 1 bilhão entre 2020 e 2024, mas emitiram apenas R$ 550 milhões em notas fiscais.
A discrepância chamou a atenção dos fiscais: os investigados recolheram R$ 25 milhões em tributos federais (2,5% da movimentação) e distribuíram R$ 88 milhões em lucros e dividendos. Um dos motéis chegou a repartir 64% de sua receita bruta declarada, enquanto restaurantes anexos, com CNPJs próprios, também integravam o esquema – um deles distribuiu R$ 1,7 milhão em lucros após registrar R$ 6,8 milhões em receita entre 2022 e 2023. A superintendente da Receita Federal em São Paulo, Márcia Meng, destacou a evolução do modus operandi do crime organizado em coletiva de imprensa: “A movimentação financeira desses motéis era muito diferente do que eles declaravam como receita. Então, fica claro que ali não é apenas receita [do serviço de motel], mas ali entrava dinheiro ilegal como se fosse atividade empresarial. Mas não sendo”. Ela acrescentou: “Esse é um modus operandi bastante normal. Antigamente eles não estavam inseridos na economia. Eles usavam empresas de fachada que não tinham atividade empresarial, e aparecia a receita sem atividade operacional. Hoje isso está mais sofisticado”.
Os recursos eram injetados em espécie ou via maquininhas de cartão ligadas a fintechs, como o BK Bank – considerado um “banco paralelo” do PCC –, facilitando transações comerciais e imobiliárias entre os investigados.
Entre os bens adquiridos com os recursos ilícitos, destacam-se um iate de 23 metros (inicialmente comprado por um motel e transferido a uma empresa de fachada), um helicóptero modelo Augusta A109E (adquirido em nome de um investigado), uma Lamborghini Urus (via empresa patrimonial) e terrenos para motéis avaliados em mais de R$ 20 milhões.
A Receita estima que esses itens representem apenas 10% do patrimônio real dos envolvidos, com operações imobiliárias como a compra de um imóvel de R$ 1,8 milhão em 2021 e outro de R$ 5 milhões em 2023 por CNPJs de motéis. Além disso, uma empresa de investimentos funcionava como centralizadora de pagamentos, atuando como “buraco negro” para a lavagem, com indícios de inconsistências fiscais em declarações de seus administradores.
A operação, que mobilizou 64 servidores da Receita Federal, 28 promotores do MP-SP, representantes da Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz-SP) e cerca de 100 policiais militares, revela conexões com outras ações contra o crime organizado, como a Operação Rei do Crime. Indícios incluem transações compartilhadas de helicópteros, reservas conjuntas de passagens internacionais e vínculos com a Operação Carbono Oculto, que desmantelou infiltrações do PCC em fintechs da Avenida Faria Lima.
O nome “Spare” remete ao boliche, simbolizando a derrubada completa dos “pinos” do esquema em uma única rodada. O promotor Silvio Loubeh, do Gaeco, afirmou: “Descobrimos um grupo criminoso que era responsável pela lavagem de dinheiro não só através desses postos, mas controlava diversos outros postos, empresas de fachada que movimentaram milhões de reais e também uma rede de motéis na Baixada, capital e Grande São Paulo”.
As investigações apontam para crimes como sonegação fiscal, adulteração de combustíveis, crimes ambientais, estelionato e lavagem de dinheiro, inclusive do tráfico de drogas. Recentemente, a Receita deflagrou a Operação Cadeia de Carbono (19 de setembro), apreendendo cargas de petróleo e derivados avaliadas em R$ 240 milhões no Porto do Rio de Janeiro, e publicou portaria em 24 de setembro para intensificar o combate a fraudes em importações.
O órgão reforça: “A Receita Federal segue no seu compromisso de garantir a regularidade das importações de petróleo e derivados e a proteção da economia nacional, excluindo do mercado empresas e indivíduos que atuam de forma irregular – seja por meio de sonegação de tributos ou pela utilização de estruturas empresariais formais para introduzir na economia recursos de origem ilícita”.
Lista Completa de Alvos e Suas Funções no Esquema, Segundo o MP-SP
Os 25 alvos dos mandados de busca e apreensão incluem figuras centrais como operadores, laranjas e contadores. Aqui está a relação íntegra, com detalhes das investigações:
Flávio Silvério: Apontado como principal beneficiário e comandante do núcleo. Ligado a postos, hotéis e empresas de fachada para movimentar valores.
Sharon Nogueira: Esposa de Flávio; beneficiária e sócia em empresas do grupo. Contas de parentes foram usadas para movimentações; ré em ação anterior.
Leonardo Silvério Siqueira: Sem informações adicionais sobre participação.
Maurício Soares de Oliveira: Proprietário, com a mãe, de rede de perfumaria. Empresas alvo de alertas do Coaf por depósitos em espécie (100% dos recursos) e receita crescente na pandemia.
Eduardo Silvério Siqueira: Usou suposto empréstimo de R$ 1,5 milhão de Maurício para justificar aumento patrimonial.
Adriana Siqueira de Oliveira: Responsável pela AFS Apoio Administrativo, usada para comprar combustível para helicóptero.
Stefania Cusumano Pereira: Vinculada a movimentações de valores pela organização.
João Martinho do Carmo Crespim: “Laranja” para Flávio e Eduardo Silvério.
Tatiana Aparecida Crispim: Mesma função de João Martinho.
Valdir de Souza Vicente: Sócio de administradora de postos, mas com salário baixo; citado em BO por fraude em bombas de posto.
Suelen Ramos Santos: Sem informações sobre participação.
Rodrigo Cavarzere dos Santos: “Laranja” utilizado pela organização.
Wagner dos Santos: “Laranja” para Flávio e Eduardo Silvério.
Reinaldo José Bezerra: Ligado a Flávio; réu com esposa por venda de combustível adulterado; filho recebeu valores de empresas de fachada.
Alex Batista Medeiros: “Laranja” para quadro societário de postos controlados pelo grupo.
Felipe Teles de Oliveira Souza: Sem informações sobre participação.
Lucas Rodrigues Pegoraro: Sem informações sobre participação.
Rosangela Ferreira de Aquino: Sem informações sobre participação.
Gilberto Lauriano Júnior: Contador central para atividades da organização; possui procuração de 941 empresas na Receita, mais de 200 no ramo de combustíveis.
João Muniz Leite: Contador ativo nas condutas de Flávio, Adriana e Eduardo; responsável por declarações de Imposto de Renda.
No núcleo de empresa de investimentos:
Mário Luiz Gabriel Gardin: Criador da empresa; inconsistências em declarações fiscais.
Caio Henrique Hyppolito Galvani: Administrador; indícios de capacidade financeira relevante como operador.
Camila Cristina de Moura Silva: Recebeu procuração, exercendo função de confiança.
Danilo Augusto Tonin Elena: Responsável atual; “laranja” para ocultar donos reais.
Marcelo Dias de Moraes: Empresa e conta pessoal favorecidas por créditos da empresa ligada a Caio.
As defesas dos citados não foram localizadas até o fechamento desta reportagem.
A operação busca bloquear R$ 7,6 bilhões em bens de 55 réus para compensar sonegações, com ações judiciais já ajuizadas para o confisco de veículos, contas e ações.
Essa rede expõe os desafios no combate à infiltração do crime organizado na economia formal, com impactos diretos para consumidores e a arrecadação pública. Autoridades prometem ações contínuas para desarticular estruturas semelhantes.
Palavras-chave: Operação Spare, PCC, lavagem de dinheiro, Receita Federal, Ministério Público SP, Flávio Silvério Siqueira, motéis laranjas, postos de combustíveis, crime organizado, São Paulo.
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