O novo paradigma da Justiça Eleitoral no combate à desinformação: Entre a proatividade e os limites da liberdade de expressão
Por Dalmo Roumiê*
O processo eleitoral contemporâneo, marcado pela transferência dos debates políticos para as redes sociais, confronta o Direito Eleitoral com um desafio complexo e inadiável: o combate à desinformação massiva. A desinformação, que se vale da própria mecânica das plataformas e dos trend topics para potencializar sua disseminação (Pimenta et al., 2024), atinge o cerne da problemática que reside na natureza das plataformas digitais. A autorregulação e o impacto da programação algorítmica têm o potencial de desequilibrar a igualdade da disputa e, consequentemente, comprometer a lisura do pleito.
Esta migração do debate público para o ambiente virtual revelou a insuficiência da legislação eleitoral, historicamente concebida para o cenário da mídia tradicional. O ordenamento jurídico vigente para o período pré-redes sociais não se mostra suficiente para identificar e coibir abusos, dada a autonomia das plataformas que, indo além da mera intermediação, detêm o poder de estipular o conteúdo permitido e, crucialmente, definir o alcance que cada postagem possui (Bueno, 2023).
Disso, podemos inferir um problema central: como equilibrar a atuação proativa da Justiça Eleitoral no combate à desinformação digital com a salvaguarda da liberdade de expressão como direito fundamental? O objetivo geral é compreender os fundamentos jurídicos e os limites constitucionais dessa atuação, com foco nas inovações trazidas pelo ambiente digital e pelas tecnologias de Inteligência Artificial. Adota-se como método uma abordagem qualitativo-descritiva, baseada na análise doutrinária, jurisprudencial e normativa, com ênfase nas resoluções recentes do Tribunal Superior Eleitoral e na literatura especializada.
Diante desse vácuo regulatório e da ameaça direta à autenticidade eleitoral — conceito que pressupõe a máxima identificação entre a vontade livre do eleitor e a formação das casas legislativas (Salgado, citado em Bueno, 2023) —, a Justiça Eleitoral brasileira tem se deslocado de um papel tradicionalmente reativo para uma postura proativa e profilática na gestão da informação. Tal expansão de competência, exercida por meio do poder regulamentar e de polícia, impõe-se como um imperativo para a defesa da integridade eleitoral frente à desinformação.
Neste contexto, o presente artigo propõe analisar o novo paradigma de atuação da Justiça Eleitoral, pautado na necessidade de assegurar os pressupostos de um regime democrático. A atuação da Justiça Eleitoral é, em essência, uma tentativa de resguardar o pilar dialético do Direito Eleitoral, composto pelos princípios da liberdade e da igualdade, visando garantir a liberdade do eleitor em escolher sem coação seus representantes. No entanto, impõe-se uma análise crítica sobre a contínua e delicada calibração dos limites entre garantir a legitimidade do pleito e preservar o direito fundamental à liberdade de expressão e o acesso a fontes alternativas de informação. O risco de excesso estatal e de censura prévia exige a ponderação rigorosa que será o foco deste trabalho.
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