O escândalo da 123 Milhas: brasileiros lesados aguardam ressarcimento em processo estagnado
Milhares de consumidores seguem sem solução após cancelamentos de passagens e pacotes promocionais, enquanto o processo de recuperação judicial da 123 Milhas enfrenta entraves e denúncias de fraudes
Em agosto de 2023, a agência de viagens online 123 Milhas chocou cerca de 800 mil brasileiros ao suspender a emissão de passagens e pacotes da linha “Promo”, deixando consumidores sem viagens planejadas e com prejuízos financeiros significativos.
Dois anos depois, o caso permanece sem resolução, com o processo de recuperação judicial da empresa, que acumula dívidas de R$ 2,3 bilhões, enfrentando atrasos e contestações. Denúncias de fraudes financeiras, incluindo transferências suspeitas e favorecimento de credores, intensificam a desconfiança dos consumidores, que aguardam reembolsos em um cenário de incertezas.
A crise que abalou o turismo online
Fundada em 2016 em Belo Horizonte, a 123 Milhas ganhou popularidade oferecendo passagens aéreas e pacotes promocionais a preços competitivos, utilizando um modelo baseado em milhas e datas flexíveis. No entanto, em 18 de agosto de 2023, a empresa anunciou a suspensão da linha “Promo” para embarques entre setembro e dezembro, citando “persistência de fatores econômicos e de mercado adversos, relacionados principalmente à pressão da demanda e ao preço das tarifas aéreas”, conforme comunicado oficial.
A decisão afetou diretamente milhares de consumidores, que enfrentaram cancelamentos abruptos e dificuldades para obter reembolsos. “Eu planejei meu casamento em Alagoas, e 160 convidados compraram passagens com a 123 Milhas. Ninguém embarcou, e agora os valores das passagens estão muito mais altos”, lamentou Samantha Bueno, oceanógrafa de Curitiba, em entrevista ao G1.
A revolta se espalhou pelas redes sociais, com plataformas como Twitter e Reclame Aqui registrando milhares de queixas. Consumidores relataram prejuízos que incluíam não apenas os valores pagos, mas também despesas adicionais, como hospedagens e ingressos. A oferta de vouchers como única forma de ressarcimento foi amplamente criticada, considerada abusiva por especialistas e órgãos de defesa do consumidor.
Investigações criminais e denúncias
O caso ganhou contornos criminais com investigações conduzidas pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). Em dezembro de 2024, cinco gestores do grupo 123 Milhas foram denunciados por crimes como fraude a credores, lavagem de dinheiro, favorecimento de credores e infrações contra as relações de consumo. O MPMG apontou que, entre junho de 2022 e agosto de 2023, a empresa enganou consumidores ao promover a linha “Promo” enquanto já enfrentava problemas de viabilidade financeira.
A denúncia destacou práticas como a distribuição de R$ 26,2 milhões em dividendos a sócios, em detrimento de R$ 153 milhões devidos a credores, e transferências suspeitas de R$ 11,5 milhões a uma agência de publicidade para ocultar valores. “Os denunciados agiram de forma deliberada e dissimulada, prejudicando consumidores e adotando estratégias fraudulentas para reforçar sua posição no mercado”, afirma a denúncia, conforme publicada pelo portal Migalhas.
O Procon-SP e a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) também atuaram. O Procon notificou a empresa em agosto de 2023, exigindo esclarecimentos sobre os cancelamentos e a política de reembolsos. “A empresa não pode impor vouchers como única forma de reembolso. Isso fere o Código de Defesa do Consumidor”, declarou Rodrigo Tritapepe, diretor de atendimento do Procon-SP, à CNN Brasil.
A Senacon considerou a prática de cancelamento unilateral abusiva, reforçando a necessidade de restituição em dinheiro.
O processo de recuperação judicial
A 123 Milhas entrou com pedido de recuperação judicial em agosto de 2023, aceito pela 1ª Vara Empresarial de Belo Horizonte. O processo, que envolve as empresas 123 Milhas, HotMilhas, MaxMilhas, Lance Hotéis e Novum, busca reestruturar dívidas estimadas em R$ 2,3 bilhões, sendo R$ 1,3 bilhão devidos a consumidores. Em dezembro de 2024, a empresa protocolou seu plano de recuperação, que prevê cinco opções de pagamento aos credores, conforme detalhado pela Defensoria Pública de Minas Gerais:
Pagamento integral em 12 parcelas semestrais, com início após 78 meses (6,5 anos) da homologação do plano, com possibilidade de antecipação via cashback em novas compras.
Pagamento de 60% do crédito em 12 parcelas semestrais, começando após 18 meses (1,5 ano) da homologação, limitado a R$ 80 milhões.
Pagamento máximo de R$ 450 em 10 parcelas semestrais, iniciando após 30 meses (2,5 anos), limitado a R$ 120 milhões.
Pagamento de 75% do crédito em parcela única, após 150 meses (12,5 anos).
Pagamento integral em 8 parcelas semestrais, começando após 150 meses (12,5 anos).
Os credores tiveram até 10 de abril de 2025 para apresentar objeções ao plano, via Defensoria Pública (para consumidores carentes) ou advogado. Caso haja contestações, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais convocará uma Assembleia Geral de Credores, possivelmente virtual, para aprovar, modificar ou rejeitar o plano. Se rejeitado, a empresa pode enfrentar a falência. “Havendo modificação ou acolhimento, prossegue-se com o cumprimento do plano. Em caso de rejeição, o caminho será a falência”, explicou a época Gabriel de Brito Silva, especialista em direito do consumidor, à CBN.
Situação atual do processo
Em 2025, o processo enfrenta entraves significativos. Em janeiro de 2024, a juíza Cláudia Helena Batista suspendeu a recuperação judicial até a nomeação de novos administradores judiciais e exigiu esclarecimentos sobre empresas relacionadas, como MaxMilhas e Lance Hotéis. Até agosto de 2025, o plano apresentado em dezembro de 2024 ainda não foi homologado, e mais de 750 contestações foram registradas por credores. A segunda lista de credores, publicada em março de 2025, atualizou os valores devidos, mas ainda aguarda publicação oficial pela Justiça para abrir o prazo de habilitações judiciais.
Decisões judiciais recentes reforçam a centralização das cobranças no processo de recuperação. Em julho de 2025, a juíza Beatriz Junqueira Guimarães extinguiu uma ação de execução movida por consumidores, determinando que os créditos sejam habilitados no processo coletivo. “Não é possível penhorar bens da empresa fora do processo de recuperação judicial”, afirmou a juíza, conforme noticiado pelo Mercado e Eventos.
Em fevereiro de 2025, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), por decisão do ministro Herman Benjamin, negou liminar da 123 Viagens e Turismo Ltda. para suspender uma execução em São Caetano do Sul, reforçando que não há risco iminente de bloqueio de bens fora do processo.
Golpes e orientações aos consumidores
A crise também abriu espaço para fraudes. Golpistas têm se passado por representantes da 123 Milhas, solicitando dados financeiros via WhatsApp para supostos reembolsos. “Não é comum uma empresa pedir dados financeiros. O consumidor deve desconfiar e denunciar à Polícia Civil”, alertou Renata Ruback, do IBCTD.
As administradoras judiciais reforçam que comunicações oficiais ocorrem apenas pelo site rj123milhas.com.br.
Consumidores lesados devem:
Habilitar créditos no site da recuperação judicial (rj123milhas.com.br), anexando comprovantes até 26 de novembro de 2024.
Registrar reclamações em plataformas como consumidor.gov.br e Procon.
Continuar pagando parcelas, se aplicável, para demonstrar boa-fé em processos judiciais.
Consultar advogados especializados para ações coletivas ou individuais.
Um futuro incerto
O caso 123 Milhas expõe fragilidades no mercado de turismo online e a necessidade de maior fiscalização. A empresa nega irregularidades e promete cumprir o plano de recuperação, mas a demora e os prazos longos propostos – que podem chegar a 12,5 anos – geram desconfiança. “Ganhei o processo contra a 123 Milhas, mas ainda espero o pagamento. Eles têm muitas pessoas para quitar”, disse Carla Yasmin de Abreu, fonoaudióloga, ao iG.
Consumidores como ela enfrentam um longo caminho, enquanto o Judiciário e órgãos como o Procon e a Senacon tentam garantir justiça.
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