Leilão da ANP arrecada R$ 989 milhões com blocos de petróleo em meio a protestos
Exploração na Foz do Amazonas e outras bacias gera debate sobre equilíbrio entre economia e preservação ambiental às vésperas da COP 30
O 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão (OPC), realizado pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) na terça-feira (17), movimentou o setor energético brasileiro ao arrecadar R$ 989,26 milhões com a venda de 34 dos 172 blocos exploratórios ofertados. As áreas, localizadas nas bacias de Foz do Amazonas, Parecis, Santos e Pelotas, totalizam 28.359,55 quilômetros quadrados. Apesar do sucesso financeiro, o leilão foi marcado por intensos protestos de indígenas, quilombolas, pescadores e ambientalistas, que denunciam riscos socioambientais, especialmente na sensível região da Foz do Amazonas, às vésperas da COP 30, que será sediada no Brasil em 2025.
Resultados financeiros e participação das empresas
Nove empresas, sendo duas nacionais e sete estrangeiras, participaram do certame, que alcançou um ágio médio de 534,47% e uma previsão de R$ 1,45 bilhão em investimentos exploratórios mínimos. A Bacia da Foz do Amazonas foi o destaque, concentrando 85% da arrecadação com 19 blocos arrematados, que renderam R$ 845 milhões em bônus de assinatura. A Petrobras, em consórcio com a ExxonMobil, adquiriu dez blocos na Foz do Amazonas, enquanto o consórcio Chevron/CNPC levou nove. Na Bacia de Santos, 11 blocos foram concedidos por R$ 133 milhões, com vencedoras como Karoon, Shell e Equinor. A Bacia de Pelotas teve três blocos arrematados por um consórcio entre Petrobras e Petrogal, e a Bacia do Parecis viu a estreia da Dillianz, empresa ligada ao agronegócio, com um bloco. A Bacia Potiguar, próxima a Fernando de Noronha, não atraiu lances.
A diretora-geral interina da ANP, Patrícia Baran, celebrou o resultado, destacando a confiança dos investidores no potencial exploratório do Brasil. “Tivemos ágio de quase 3.000% em áreas da Margem Equatorial e concorrência em 7 dos 19 blocos arrematados. Foi a primeira vez que áreas dessa região foram ofertadas na modalidade de oferta permanente”, afirmou. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, reforçou que a inclusão de áreas como a Foz do Amazonas, Parecis e Pelotas visa distribuir a riqueza do petróleo de forma equilibrada, promovendo crescimento econômico, inclusão social e responsabilidade ambiental.
Protestos e críticas socioambientais
O leilão enfrentou forte resistência. Cerca de 250 pessoas, incluindo lideranças indígenas dos povos Tapayuna, Manoki e Parecis, do Mato Grosso, protestaram em frente ao Hotel Courtyard, no Rio de Janeiro, onde o evento ocorreu. Yaiku Tapayuna, jovem líder indígena, classificou o leilão como um ataque aos territórios tradicionais: “É um impacto que vai acontecer no nosso território. Nós, povos indígenas, somos contra porque é um lugar sagrado”. A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) também repudiou o certame, especialmente a oferta do Bloco 59, na costa do Amapá, próximo a territórios quilombolas, denunciando racismo ambiental e falta de consulta às comunidades.
Na Baía de Guanabara, pescadores e membros do Instituto Internacional Arayara ergueram uma faixa com a mensagem “Parem o Leilão do Juízo Final”, alertando para os riscos climáticos e sociais da exploração. Nicole Figueiredo de Oliveira, diretora do Arayara, criticou a oferta de 45 blocos na Foz do Amazonas sem análises ambientais adequadas, destacando que a iniciativa contradiz os compromissos climáticos do Brasil, que sediará a COP 30. “Já apresentamos cinco ações civis públicas e vamos continuar questionando esse leilão”, afirmou.
O Greenpeace Brasil também se posicionou, classificando a oferta de 47 blocos na Foz do Amazonas como “inaceitável” em um ano de COP 30. Mariana Andrade, porta-voz de Oceanos do Greenpeace, destacou os riscos à biodiversidade única da região, como o Grande Sistema de Recifes da Amazônia e os manguezais, essenciais para a segurança alimentar de comunidades locais. Um estudo apoiado pelo Greenpeace apontou que, em caso de derramamento de óleo, as correntes marinhas poderiam espalhar impactos rapidamente, afetando ecossistemas e comunidades costeiras.
Contexto ambiental e judicial
A Bacia da Foz do Amazonas, parte da Margem Equatorial, é considerada uma nova fronteira petrolífera, comparada ao pré-sal, mas enfrenta desafios socioambientais significativos. Nos últimos anos, empresas como Total Energies e BP desistiram de projetos na região devido a dificuldades no licenciamento ambiental. A Petrobras, que busca há anos uma licença para perfurar o Bloco 59, planeja um simulado de emergência em julho, que pode ser decisivo para a decisão do Ibama.
O Ministério Público Federal (MPF) no Pará tentou suspender o leilão, argumentando que a oferta de blocos na Foz do Amazonas contraria os compromissos climáticos do Brasil, como o Acordo de Paris. A ação, movida dias antes do certame, não obteve sucesso imediato, mas soma-se a cinco ações judiciais do Instituto Arayara, que questionam 117 dos 172 blocos ofertados por riscos a terras indígenas, territórios quilombolas e unidades de conservação.
Impactos e dilemas para o Brasil
O leilão reacende o debate sobre o equilíbrio entre desenvolvimento econômico e preservação ambiental. Para o governo, a exploração de novas fronteiras é essencial para repor reservas após o esgotamento do pré-sal, esperado para a próxima década, e para garantir segurança energética em um contexto de conflitos globais, como no Oriente Médio. Roberto Ardenghy, presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), destacou a relevância do certame em um cenário de preços elevados do petróleo.
No entanto, ambientalistas e comunidades tradicionais veem a iniciativa como um retrocesso. Ricardo Fujii, do WWF-Brasil, criticou a Petrobras por priorizar projetos de alto impacto em vez de liderar a transição energética. “Estamos falando de uma das regiões mais sensíveis do planeta, essencial para a pesca e o sustento de milhares de famílias”, afirmou. A ONG alemã Urgewald também questionou o papel do Brasil como líder climático, apontando que o país recebeu US$ 6,2 bilhões em investimentos em exploração, sendo um dos principais players globais no setor.
O que vem pela frente
Os blocos arrematados ainda dependem de licenciamento ambiental, um processo que pode levar anos e enfrentar resistência judicial. Os contratos de concessão estão previstos para serem assinados em 28 de novembro, após etapas documentais que se encerram em 9 de julho. Enquanto isso, a pressão de organizações socioambientais e comunidades tradicionais deve continuar, especialmente com a proximidade da COP 30, que colocará o Brasil sob os holofotes globais na agenda climática.
O leilão da ANP reflete o dilema do Brasil: aproveitar o potencial econômico do petróleo ou priorizar a preservação de ecossistemas e os direitos de povos tradicionais. A escolha do governo, por ora, parece pender para o primeiro, mas as consequências ambientais e sociais ainda estão por vir.
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