Lei Magnitsky: Bulgária rejeitou sanções dos EUA, mas extrema direita brasileira celebra ataque a Moraes
Sanções dos EUA contra Alexandre de Moraes geram apoio da extrema direita brasileira, mas precedente búlgaro reforça que medidas unilaterais não têm força legal automática no Brasil; entenda
No dia 30 de julho de 2025, o governo dos Estados Unidos, sob a administração de Donald Trump, anunciou sanções contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), com base na Lei Global Magnitsky. A medida, publicada pelo Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC) do Departamento do Tesouro americano, acusa Moraes de promover uma "campanha opressiva de censura", detenções arbitrárias e perseguição judicial, especialmente contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, réu por tentativa de golpe de Estado em 2022.
A decisão, inédita contra um ministro de uma Suprema Corte em um país democrático, gerou reações intensas no Brasil, com setores da extrema direita celebrando a sanção como uma suposta "sentença internacional" contra o STF. No entanto, a experiência da Bulgária, que rejeitou a aplicação da mesma lei em 2022, evidencia que tais sanções unilaterais não têm força jurídica automática em nações soberanas, expondo o uso político da medida no caso brasileiro.
Contexto da Lei Magnitsky e sua aplicação
A Lei Magnitsky, aprovada em 2012 durante o governo de Barack Obama, foi criada inicialmente para punir autoridades russas responsáveis pela morte do advogado Sergei Magnitsky, que denunciou esquemas de corrupção estatal e morreu em uma prisão de Moscou em 2009.
Em 2016, a legislação foi ampliada pelo Global Magnitsky Act, permitindo sanções contra indivíduos e entidades em qualquer parte do mundo acusados de graves violações de direitos humanos ou corrupção significativa.
As punições incluem bloqueio de bens nos EUA, proibição de entrada no país e restrições a transações com cidadãos ou empresas americanas. Desde 2017, mais de 650 pessoas e entidades, incluindo ex-presidentes, juízes e líderes de regimes autoritários, foram sancionadas, como o ex-presidente do Paraguai Horacio Cartes e autoridades chinesas acusadas de abusos contra minorias uigures.
No caso de Moraes, as sanções foram justificadas pelo secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, que acusou o ministro de ser "juiz e júri" em uma "caça às bruxas" contra Bolsonaro, jornalistas e empresas de mídia americanas, como a Trump Media & Technology Group (TMTG) e a plataforma Rumble.
A medida foi articulada por figuras como o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que, desde março de 2025, tem atuado nos EUA junto a parlamentares republicanos, como Cory Mills, para pressionar por punições ao STF. O próprio Trump vinculou a sanção a retaliações comerciais, como a tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, anunciada em julho de 2025, em resposta ao processo contra Bolsonaro.
A reação brasileira e a defesa da soberania
O governo brasileiro reagiu com firmeza. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) classificou a sanção como "inaceitável" e uma tentativa de interferência no Judiciário brasileiro, prestando solidariedade a Moraes.
A Advocacia-Geral da União (AGU) anunciou que adotará medidas para defender a soberania nacional, enquanto o STF reiterou que as decisões de Moraes, especialmente no inquérito sobre a tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023, foram referendadas pelos demais ministros da Corte.
O ministro Flávio Dino, aliado de Moraes, destacou que o colega apenas cumpre seu papel constitucional. Parlamentares da esquerda, como Sâmia Bomfim (PSOL-SP) e Lindbergh Farias (PT-RJ), criticaram a ação como um ataque à soberania brasileira e uma tentativa de garantir impunidade a Bolsonaro.
Moraes, por sua vez, declarou que ignorará as sanções e seguirá trabalhando normalmente, comparando a pressão internacional às táticas "golpistas" de milicianos. Em discurso na abertura do segundo semestre do Judiciário, em 1º de agosto de 2025, ele afirmou que o STF não se curvará a ameaças externas e acusou os articuladores das sanções de cometerem crimes como coação no curso do processo, obstrução de investigação e atentado à soberania nacional.
O precedente búlgaro: um alerta sobre soberania
Um caso emblemático desmonta a narrativa da extrema direita brasileira de que a Lei Magnitsky teria validade automática no Brasil. Em 2021, os EUA sancionaram empresários e autoridades búlgaras, incluindo figuras como Delyan Peevski, acusado de corrupção. O governo búlgaro, inicialmente, editou uma resolução para implementar as sanções em seu território. No entanto, o Supremo Tribunal Administrativo da Bulgária, em 2022, declarou a resolução nula, afirmando que as sanções americanas não tinham efeito jurídico direto no país por ausência de base legal nacional ou tratado internacional ratificado.
A decisão reforçou que a soberania jurídica búlbara prevalecia sobre imposições unilaterais dos EUA, mesmo em um contexto de aliança com Washington no âmbito da União Europeia. Esse precedente é especialmente relevante para o Brasil. A Constituição de 1988, em seu artigo 1º, inciso I, estabelece a soberania como um dos fundamentos do Estado brasileiro.
Especialistas em direito internacional, como Priscila Caneparo, pós-doutora na área, destacam que a aplicação da Lei Magnitsky a Moraes carece de legitimidade jurídica, pois não há provas concretas de violações graves de direitos humanos, como tortura ou execuções extrajudiciais, exigidas pela legislação americana.
Além disso, decisões judiciais de Moraes, como a suspensão de contas em redes sociais por desinformação, estão amparadas pela jurisdição brasileira e referendadas pelo STF, em um país reconhecido como democracia por índices internacionais, como os da Freedom House e do V-Dem.
O uso político da Lei Magnitsky
A aplicação da Lei Magnitsky contra Moraes é vista por analistas como uma politização do instrumento. Rodrigo Amaral, professor de Relações Internacionais da PUC-SP, argumenta que sancionar um ministro de uma Suprema Corte democrática é uma tentativa de constrangê-lo, não um ato jurídico fundamentado.
A advogada Natalia Kubesch, da organização britânica Redress, aponta que a inclusão de Moraes na lista de sanções é "semilegal" e "semipolítica", destacando que a lei costuma ser usada contra autoridades de regimes autoritários, não contra juízes de democracias consolidadas.
A articulação de Eduardo Bolsonaro com parlamentares republicanos e a celebração de aliados de Jair Bolsonaro, como os deputados Nikolas Ferreira (PL-MG) e Carol de Toni (PL-SC), reforçam a percepção de que a sanção é parte de uma estratégia para deslegitimar o STF e proteger Bolsonaro, acusado de liderar uma tentativa de golpe.
Organizações como a Human Rights First alertam que o uso da Lei Magnitsky nesse contexto cria um precedente perigoso, projetando disputas políticas internas do Brasil no cenário internacional e tensionando as relações diplomáticas com os EUA.
Implicações práticas e limites das sanções
Na prática, as sanções contra Moraes incluem o bloqueio de eventuais bens nos EUA, a proibição de transações com cidadãos ou empresas americanas e a suspensão de serviços digitais de companhias como Google, Meta e Apple. No entanto, o STF informou que Moraes não possui bens nos EUA, e especialistas como Eveline, citada pelo Estadão, destacam que as sanções não afetam automaticamente contas bancárias ou bens fora do território americano, devido à soberania nacional.
Além disso, a possibilidade de suspensão de contas em redes sociais é incerta, pois vetar o acesso de Moraes a plataformas como X ou YouTube poderia ser interpretado como uma violação da liberdade de expressão, uma "zona jurídica cinzenta", segundo Kubesch.
A decisão da Bulgária de rejeitar a aplicação da Lei Magnitsky serve como um lembrete de que nações soberanas podem e devem proteger sua autonomia jurídica. No Brasil, a sanção contra Moraes não altera a legitimidade de suas decisões judiciais, que continuam respaldadas pelo STF e pela Constituição.
A tentativa de setores da extrema direita de apresentar a medida como uma condenação legítima ignora o princípio da soberania e o contexto político por trás da ação americana, que parece mais alinhada aos interesses de Trump e Bolsonaro do que a uma defesa genuína dos direitos humanos.
Um chamado à reflexão
A aplicação da Lei Magnitsky contra Alexandre de Moraes não é apenas um ataque a um ministro do STF, mas um desafio à independência do Judiciário brasileiro e à soberania nacional. Enquanto a extrema direita celebra, esquecem que, por critérios objetivos, Jair Bolsonaro seria um alvo mais plausível para sanções, dado seu histórico de ataques à democracia, incentivo ao golpismo e políticas que levaram à destruição ambiental e violações de direitos humanos.
A Bulgária já mostrou o caminho: um país soberano não se curva a imposições externas sem fundamento legal. Cabe ao Brasil reafirmar sua autonomia e proteger suas instituições democráticas.
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