Impasse em Porto Velho: Justiça restabelece contrato emergencial de coleta de lixo após decreto da Câmara
Decisão judicial suspende decreto legislativo e garante continuidade dos serviços de limpeza urbana, enquanto disputa sobre licitação emergencial segue em debate
Em uma decisão publicada no último dia 25 de agosto de 2025, o Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO), por meio do desembargador Daniel Ribeiro Lagos, concedeu tutela de urgência em um agravo de instrumento (n. 0809464-55.2025.8.22.0000) movido pelo Ministério Público do Estado de Rondônia (MPRO), restabelecendo o Contrato Emergencial n. 028/PGM/2025, firmado entre o Município de Porto Velho e o Consórcio Eco PVH.
A medida suspende os efeitos do Decreto Legislativo n. 601/CMPV/2025, editado pela Câmara Municipal de Porto Velho, que havia sustado o contrato sob a alegação de irregularidades no processo de contratação emergencial. A decisão, que abrange um processo de 15 páginas, reforça a legalidade do contrato e destaca a necessidade de garantir a continuidade dos serviços essenciais de coleta, transporte e destinação de resíduos sólidos, evitando riscos de colapso sanitário e ambiental na capital rondoniense.
O MPRO, representado pelo próprio órgão como advogado do agravante, argumentou que a decisão da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Porto Velho, ao indeferir o pedido de tutela de urgência na Ação Incidental de Nulidade de Ato Legislativo n. 70040644-97.2025.8.22.0001, desconsiderou os princípios do fumus boni iuris (probabilidade do direito) e do periculum in mora (perigo da demora).
Segundo o MPRO, a sustação do contrato pela Câmara Municipal violou a Lei Orgânica Municipal, decisões do Tribunal de Contas do Estado de Rondônia (TCE-RO) e precedentes judiciais, além de comprometer a prestação de um serviço público essencial."A sustação do contrato emergencial compromete a continuidade de serviço público essencial, expondo a coletividade a risco iminente de colapso sanitário e ambiental", destacou o MPRO no agravo de instrumento.
Origem do conflito: Irregularidades na licitação
O embate tem raízes em um processo licitatório conturbado, a Concorrência Pública n. 003/2021/CPL-OBRAS, destinada à contratação de serviços de coleta, reciclagem e destinação final de resíduos sólidos por meio de uma Parceria Público-Privada (PPP) com valor estimado em R$ 2,3 bilhões ao longo de 20 anos.
O procedimento, conduzido pela Secretaria Municipal de Serviços Básicos (SEMUSB), foi alvo de sucessivas suspensões pelo TCE-RO devido a graves irregularidades, incluindo restrição à competitividade, alterações substanciais no edital sem republicação, falhas no projeto básico e critérios questionáveis de julgamento.
Em 29 de abril de 2024, o então prefeito de Porto Velho homologou o certame e assinou o Contrato n. 019/PGM/2024 com a Ecorondônia Ambiental S/A, uma sociedade de propósito específico constituída pela Marquise Serviços Ambientais S/A, vencedora da licitação. Contudo, no dia seguinte, o TCE-RO, por meio do Acórdão APL-TC n. 68/2024, declarou a nulidade do edital e de todos os atos dele decorrentes, determinando a anulação do contrato. A decisão foi reforçada pelo Acórdão APL-TC n. 105/2024, de 11 de junho de 2024, que afastou a tentativa de "convalidar" o procedimento por meio da Lei Municipal n. 3.174/2024, aprovada pela Câmara Municipal em tempo recorde.
O TCE-RO considerou a lei uma manobra para contornar sua decisão vinculante e aplicou multas aos gestores responsáveis, encaminhando cópias ao MPRO para apuração de possível improbidade administrativa."A tentativa de convalidar ato nulo por meio de lei municipal é inconstitucional e contraria a competência do Tribunal de Contas", ressaltou o MPRO na ação.
Contratação emergencial e intervenção da Câmara
Com a anulação do contrato, a nova gestão municipal, sob o comando do prefeito Leonardo Barreto de Moraes, emitiu a Decisão n. 001/2025/GAB-PREF/PMPV, anulando o contrato anterior e instaurando um procedimento de contratação emergencial para garantir a continuidade dos serviços de limpeza urbana. O Processo Licitatório Emergencial n. 00600-00004165/2025-49, regido pelo Decreto n. 19.340/2025 e baseado no artigo 75, inciso VIII, da Lei n. 14.133/2021, foi considerado regular pelo TCE-RO em relatório técnico de 16 de abril de 2025, com algumas adequações contratuais sugeridas pelo Ministério Público de Contas.
O certame emergencial atraiu oito propostas, sendo a Aurora Serviços Ltda. declarada vencedora com a oferta de menor preço, no valor de R$ 19.056.713,81. Contudo, a empresa foi inabilitada por suposta falta de comprovação de capacidade técnica, o que levou à convocação da segunda colocada, o Consórcio Eco PVH, que firmou o Contrato n. 028/PGM/2025 em 28 de março de 2025. Inconformada, a Aurora Serviços Ltda. impetrou o Mandado de Segurança n. 7019110-97.2025.8.22.0001, obtendo liminar em 16 de abril de 2025 para suspender o procedimento emergencial. O Município, por sua vez, conseguiu reverter a liminar por meio da Suspensão de Liminar e de Sentença n. 0807578-21.2025.8.22, em 15 de julho de 2025, sob o argumento de que a paralisação do certame causaria "grave lesão à ordem pública administrativa, risco à saúde pública e lesão à economia pública".
Em resposta, a Câmara Municipal, presidida por Francisco Gedeão Bessa Holanda de Negreiros, editou o Decreto Legislativo n. 601/CMPV/2025, originado do Projeto de Decreto Legislativo n. 635/2025, sustando o contrato com o Consórcio Eco PVH. A justificativa apresentada pelos vereadores apontava que a inabilitação da Aurora Serviços Ltda. foi irregular e que a contratação do Consórcio Eco PVH geraria prejuízo ao erário, já que a proposta da Aurora era significativamente mais barata."A continuidade do contrato com a segunda colocada, que apresentou valor acima da primeira, pode gerar um dano ao erário e dificultar a retirada do serviço público caso seja reconhecida a ilegalidade na contratação", consta na justificativa do Projeto de Decreto Legislativo.
Decisão judicial e validação do TCE-RO
A decisão do desembargador Daniel Ribeiro Lagos, relatada em 25 de agosto de 2025, baseou-se em uma superveniente decisão do TCE-RO, proferida em 8 de agosto de 2025, que validou a Dispensa Emergencial n. 001/2025/SML/PVH e o Contrato n. 028/PGM/2025.
O tribunal de contas considerou o procedimento regular e afastou os efeitos do Decreto Legislativo n. 601/2025, determinando que o prefeito Leonardo Barreto de Moraes, o secretário de Saneamento e Serviços Básicos Giovanni Bruno Souto Marini, o diretor do Departamento de Saneamento Básico Marcelo Melo Barroso e a gerente da Divisão de Planejamento de Resíduos Sólidos Camila Afonso dos Santos Rosa adotassem medidas imediatas para garantir a execução do contrato, incluindo a emissão da ordem de serviço no prazo de 15 dias."A decisão convalidando o contrato cujos efeitos foram suspensos pelo decreto legislativo, agora também invalidado, prepondera para justificar a provisão de urgência, notadamente por haver certeza de se adequar à legalidade", afirmou o desembargador Daniel Ribeiro Lagos.
O TCE-RO também impôs condições para a execução do contrato, como a designação de um fiscal específico para acompanhar a coleta e o quantitativo de resíduos destinados ao Aterro Sanitário de Jirau, além da implementação de um sistema digital de monitoramento em tempo real da frota contratada.
A corte determinou ainda que a Controladoria Interna do Município acompanhe a execução dessas medidas, garantindo a efetividade das determinações.
Debate sobre a separação dos poderes
A controvérsia reacende o debate sobre os limites da atuação do Poder Legislativo municipal na fiscalização de contratos administrativos. O MPRO argumentou que o Decreto Legislativo n. 601/2025 violou o princípio da separação dos poderes, previsto no artigo 2º da Constituição Federal e na Lei Orgânica do Município de Porto Velho, ao interferir indevidamente na esfera administrativa do Executivo. A Câmara, por sua vez, defendeu sua competência fiscalizatória, amparada pelo artigo 48, inciso XVIII, da Lei Orgânica, que prevê a fiscalização e controle dos atos do Executivo, incluindo a administração indireta.
O desembargador Daniel Ribeiro Lagos reconheceu que, em princípio, a sustação de contratos administrativos é uma prerrogativa do Legislativo, conforme o princípio da simetria e a teoria dos poderes implícitos, mesmo na ausência de previsão expressa na Lei Orgânica Municipal. Contudo, a decisão do TCE-RO, ao validar o contrato emergencial, foi considerada determinante para justificar a concessão da tutela de urgência, uma vez que a continuidade dos serviços de limpeza urbana foi considerada essencial para evitar danos à saúde pública e ao meio ambiente."O controle judicial dos atos administrativos é permitido quando há ilegalidade ou abuso de poder, sem violar o princípio da separação dos poderes", ressaltou o desembargador, citando precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Impactos e perspectivas
A decisão do TJRO garante, por ora, a continuidade dos serviços de coleta de resíduos sólidos em Porto Velho, evitando o risco de interrupção que poderia levar a um colapso sanitário. No entanto, a judicialização envolvendo a Aurora Serviços Ltda. sugere que o caso ainda está longe de uma resolução definitiva. A empresa, que alega ter sido inabilitada injustamente, apresentou atestados de capacidade técnica, como o documento subscrito pelo engenheiro civil Paulo Nunes Cordeiro, de Teresina (PI), que comprovou a coleta de 53.447,36 toneladas de resíduos entre agosto e dezembro de 2024, atendendo aos requisitos do edital.
O caso também expõe desafios na gestão de contratos públicos em Porto Velho, especialmente no que diz respeito à transparência e à competitividade nos processos licitatórios.
A anulação do contrato anterior, as multas aplicadas pelo TCE-RO e a tentativa de "convalidação" por meio de lei municipal evidenciam a complexidade do tema e a necessidade de maior rigor na fiscalização.
Convite ao debate
A decisão do TJRO reacende questões cruciais sobre a gestão pública e o equilíbrio entre os poderes em Porto Velho. Você acredita que a Câmara Municipal extrapolou suas atribuições ao sustar o contrato emergencial? Ou o Legislativo agiu corretamente ao questionar a inabilitação da empresa de menor preço? Deixe sua opinião nos comentários e compartilhe esta matéria para ampliar o debate sobre a administração dos serviços essenciais na capital de Rondônia.
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