Guerra comercial de Trump ameaça domínio agrícola dos EUA e fortalece Brasil
Brasil emerge como principal beneficiário enquanto produtores americanos enfrentam nova crise com tarifas impostas por Trump; perdas podem ultrapassar US$ 27 bilhões
Em meio a uma escalada de tensões comerciais globais desencadeada pelo presidente Donald Trump, o setor agrícola americano enfrenta uma das suas maiores crises, enquanto o Brasil se posiciona para se tornar o grande vencedor desta disputa. A imposição de novas tarifas sobre produtos do México, Canadá e China já provoca uma reação em cadeia que ameaça destruir décadas de relações comerciais cuidadosamente construídas pelos agricultores americanos.
Impacto imediato e retaliações
As medidas protecionistas de Trump, que entraram em vigor em 4 de março de 2025, incluem tarifas de 25% sobre produtos do México e do Canadá, além de um adicional de 10% sobre importações chinesas. A resposta foi imediata: o Canadá anunciou retaliações com tarifas de 25% sobre cerca de US$ 100 bilhões em importações americanas, enquanto a China impôs tarifas de 10% a 15% sobre produtos agrícolas cruciais dos EUA.
"As tarifas não são algo para se divertir. Elas não apenas atingem nossas empresas familiares em cheio, mas também abalam um princípio fundamental sobre o qual nossas relações comerciais são construídas, que é a confiabilidade", afirma Caleb Ragland, presidente da Associação Americana de Soja e produtor em Kentucky.
Brasil: o grande beneficiário
O cenário atual apresenta uma oportunidade sem precedentes para o Brasil. Em 2023, as exportações agrícolas brasileiras para a China atingiram um recorde de US$ 60,24 bilhões, representando 36,2% do comércio agrícola total do país. Apenas em 2024, a China importou quase 69 milhões de toneladas de soja do Brasil, pagando US$ 30 bilhões.
Análises recentes indicam que o Brasil poderia aumentar suas exportações em até 8,9 milhões de toneladas por ano apenas em milho e soja, aproveitando o vácuo deixado pelos produtos americanos no mercado chinês.
Fragilidade do setor agrícola americano
A situação atual encontra os agricultores americanos em posição particularmente vulnerável. Segundo dados recentes:
Os preços das commodities caíram quase 50% em comparação a três anos atrás
Os custos de produção, incluindo terra, sementes, pesticidas e fertilizantes, permanecem elevados
Durante a guerra comercial de 2018, o setor agrícola americano sofreu perdas superiores a US$ 27 bilhões, com a soja respondendo por 71% desse valor
Dependência internacional e vulnerabilidades
A complexidade da situação é agravada pela interdependência das cadeias de suprimentos agrícolas. O México é atualmente o segundo maior cliente de soja, farelo e óleo de soja dos EUA, enquanto o Canadá fornece 87% do potássio utilizado pelos agricultores americanos.
"A natureza interconectada das cadeias de suprimentos agrícolas significa que as tarifas têm impactos negativos imediatos e, em muitos casos, duradouros em suas fazendas e na economia rural do país", alerta a Associação Americana de Soja.
Perspectivas e preparação chinesa
A China parece ter se preparado estrategicamente para um possível retorno de Trump à presidência. Além de investimentos domésticos substanciais, Pequim fortaleceu significativamente suas relações comerciais com o Brasil. Durante a visita oficial de Xi Jinping ao Brasil, foram firmados 6 acordos diretamente ligados ao setor agrícola, com potencial comercial estimado em US$ 500 milhões anuais.
Paradoxo político
Um aspecto notável desta crise é o apoio político que Trump mantém nas áreas rurais, apesar do impacto negativo de suas políticas comerciais. Nas últimas eleições, Trump obteve uma média de 77% dos votos em 444 condados que dependem fortemente da agricultura, vencendo em 433 deles. Em 100 desses condados, sua votação superou 80%.
Perspectivas futuras
A situação atual sugere uma reconfiguração significativa do comércio agrícola global. Enquanto os Estados Unidos arriscam perder sua posição dominante em mercados tradicionais, o Brasil se prepara para expandir ainda mais sua presença no comércio internacional de commodities agrícolas.
"Como a produção agrícola de maior exportação dos EUA, a soja enfrenta impactos enormes e desproporcionais das interrupções do fluxo comercial, especialmente para a China, que é nosso maior mercado", conclui Ragland, alertando para as consequências de longo prazo desta nova guerra comercial.
Esta reportagem foi elaborada com base em dados oficiais, declarações de líderes do setor agrícola e análises de mercado atualizadas, incluindo informações das principais agências de notícias internacionais e dados econômicos verificados.