Especialistas avaliam se Alexandre de Moraes deve julgar tentativa de golpe
PF trouxe denúncias de tentativa de golpe, com plano de assassinar Lula, Alckmin e o próprio ministro do STF, que já é relator do processo relacionado ao 8/1
“Se envolver um ministro do STF impedisse ele de julgar, nós teríamos a possibilidade de ‘crime perfeito’. Bastaria tentar matar todos os 11 ministros do STF, que nenhum deles poderia julgar. E aí, não haveria julgamento.”
Com essa provocação, o doutor e mestre em Direito Constitucional pela USP, Antonio Carlos de Freitas Jr, fala da possibilidade do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, julgar casos como o que foi revelado nos últimos dias pela Polícia Federal (PF): planejamento de golpe de Estado, incluindo trama para assassinato do presidente Luís Inacio Lula da Silva, do vice Geraldo Alckmin, e do próprio ministro do STF, Alexandre de Moraes.
“Perceba que o que está sendo cogitado é crime de golpe de estado. Não é uma tentativa de homicídio específica da pessoa física de Alexandre de Moraes. É do cargo de ministro, como do cargo de presidente, que estamos falando. Juridicamente, não há esse impedimento porque o crime é de golpe de estado, é um crime contra as instituições republicanas. O fato do ministro do STF ser um dos alvos dessa orquestração de golpe de estado não o impede necessariamente de atuar como julgador ou como relator”.
Inadequado – “Não impede. Mas, a meu juízo, seria mais adequado que ele não fosse”, é a avaliação do doutor em Direito Público e Constitucional pela ITE de Bauru/SP, Antonio Celso Baeta Minhoto. “Seria mais equilibrado ele se declarar impedido porque está diretamente envolvido. É muito difícil ele analisar de uma maneira totalmente desapaixonada e impessoal, na minha opinião”.
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Minhoto pondera, no entanto, que isso não deverá acontecer. “O STF vem fazendo isso, especialmente na figura do Alexandre de Moraes. Essa coisa de presidir inquérito, determinar a coleta de provas e ser o próprio órgão julgador. A meu ver, tudo isso junto se configura como abuso de poder. Seria mais adequado haver uma separação”.
Próximos passos – com a conclusão do inquérito pela Polícia Federal e a confirmação para o Supremo Tribunal Federal, os autos vão à Procuradoria Geral da República (PGR) que, dentro de 15 dias, irá avaliar se há indícios de materialidade e autoria do crime.
“É indício. Não é prova. Não têm de estar completamente provados o crime e sua autoria. Não. São indícios que provam que existiu o crime e que os acusados são autores deste crime. Seria um ‘começo de prova’. Porém, o suficiente para se acreditar que houve crime e que aqueles acusados sejam os autores daquele crime”, destaca Freitas Jr.
Havendo o indiciamento, os citados irão figurar numa denúncia-crime. “Seria como uma petição inicial de uma ação criminal. Você formalizou uma ação. Sai do inquérito e parte para uma ação penal”, explica Minhoto.
Se houver decisão pela continuidade da ação penal, ela vai ser iniciada no STF, com todo o processo regular, incluindo ampla defesa e contraditório, para que os réus sejam chamados, respondam, as provas sejam analisadas e os julgadores, em plenário, decidam, absolvendo ou condenando os acusados.
Sobre o prazo para essa etapa, não há tempo determinado. É o que explica Freitas: “vai depender do rito do tribunal. O que vai ser com certeza observado é a ampla defesa. Porém, a depender das prioridades da pauta, é possível, sim, que haja julgamento em 2025. Mas não há um tempo regular, um prazo legal ou regimental sobre isso”.
Julgamento e prisões – em relação ao julgamento de todos os indiciados, dependerá muito da avaliação da PGR. Minhoto, no entanto, acredita que todos provavelmente serão julgados no STF.
“É pela questão do próprio contexto. O STF foi envolvido naqueles atos. Pode haver desmembramento, se por acaso algum dos indiciados, por alguma razão, tenha de ser julgado numa instância comum. Mas acho difícil. Pelo contexto, acho que todos serão julgados no STF.”
Já em relação as possíveis prisões, incluindo a do ex-presidente Jair Bolsonaro, Antonio Carlos de Freitas Jr explica que, a qualquer momento, pode haver prisão, antes mesmo do julgamento.
“É o que a gente chama de prisão processual ou prisão preventiva. Sempre que houver indício de uma tentativa de fuga, uma obstrução de justiça ou coação de testemunha. São exemplos de possibilidades de prisões no curso do processo penal. Então, mesmo se o mérito ainda não estiver julgado, pode haver sim prisão preventiva, temporária.”
Antonio Carlos de Freitas Jr – Doutor e mestre em Direito Constitucional pela USP.
Antonio Celso Baeta Minhoto – Doutor em Direito Público e Constitucional pela ITE, de Bauru/SP; Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.