Entenda porque a justiça negou pedido de remoção de vídeo acusando Michelle Bolsonaro de ter sido 'garota de programa'
Decisão judicial reforça precedentes do STF e teoria da proteção débil para figuras públicas, mantendo conteúdo de comunicadora petista no ar
A Justiça do Distrito Federal negou, na última quarta-feira (2), o pedido da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) para a remoção de um vídeo do Instagram em que a comunicadora Teônia Pereira, ligada ao PT, a chama de “ex-garota de programa” durante um podcast.
A decisão, proferida pelo juiz da 1ª Vara Cível de Brasília, foi fundamentada em precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF) que priorizam a liberdade de expressão em conflitos com o direito à honra, especialmente quando envolvem figuras públicas.
O caso reacende o debate sobre os limites da liberdade de expressão e a regulação de conteúdos nas redes sociais no Brasil, tema que ganhou destaque em 2025 com decisões recentes do STF.
O magistrado destacou que, conforme a jurisprudência do STF, a “teoria da proteção débil do homem público” deve prevalecer em casos como esse. Essa teoria, consolidada em decisões da Corte, estabelece que figuras públicas, como políticos e ex-autoridades, possuem menor proteção à honra em comparação com cidadãos comuns, devido ao interesse público em suas ações e ao papel do debate aberto na democracia.
“Conforme precedentes da Suprema Corte, nos conflitos relacionados à liberdade de expressão e o direito à honra, sobretudo envolvendo pessoas públicas, há de ser dada preferência à liberdade de expressão, o que conduz à excepcionalidade da retirada de conteúdos, publicações, vídeos e comentários publicados na internet em sede liminar, sobretudo pela sua precariedade e cognição sumária”, afirmou o juiz em sua decisão.
Embora o pedido de remoção imediata tenha sido negado, o juiz esclareceu que o mérito do caso ainda será analisado. Isso significa que, em um julgamento definitivo, Michelle Bolsonaro poderá obter retratação, direito de resposta ou até indenização por eventuais danos morais, caso a Justiça entenda que houve violação à sua honra. A decisão reflete a cautela do Judiciário em adotar medidas drásticas, como a exclusão de conteúdos, antes de uma análise mais aprofundada, especialmente em um contexto em que a liberdade de expressão é um valor constitucional protegido.
Contexto político e a Regulação das Redes Sociais
O caso ganha relevância em um momento de intensos debates sobre a regulação das redes sociais no Brasil. Em junho de 2025, o STF decidiu, por 8 votos a 3, que plataformas digitais, como o Instagram, podem ser responsabilizadas por conteúdos ilegais publicados por usuários, mesmo sem ordem judicial prévia, desde que sejam notificadas extrajudicialmente. Essa decisão declarou a inconstitucionalidade parcial do artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), que anteriormente exigia ordem judicial para a remoção de conteúdos, com o objetivo de proteger a liberdade de expressão e evitar censura. A Corte entendeu, no entanto, que o dispositivo não era suficiente para garantir a proteção de direitos fundamentais frente à disseminação de conteúdos como desinformação, discursos de ódio e ataques à democracia.
A decisão do STF foi criticada por setores ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que se posicionou como defensor da liberdade de expressão nas redes sociais. Em maio de 2025, durante o 2º Seminário Nacional de Comunicação do Partido Liberal, Bolsonaro destacou a importância da liberdade de expressão, comparando-a ao “oxigênio” da democracia e elogiando empresas como Google e Meta por supostamente alinharem-se a esse princípio. No entanto, a decisão judicial envolvendo Michelle Bolsonaro evidencia uma contradição: enquanto o ex-presidente defende a liberdade de expressão, sua esposa buscou a remoção de um conteúdo que considerou ofensivo, utilizando o mesmo arcabouço legal que os bolsonaristas frequentemente criticam.
Reações e polarização
A negativa do pedido de Michelle Bolsonaro gerou reações polarizadas nas redes sociais. Usuários alinhados ao bolsonarismo criticaram a decisão, alegando que, se o alvo fosse uma figura pública de esquerda, como a primeira-dama Rosângela Lula da Silva (Janja), o vídeo já teria sido removido e a autora punida. “Se a frase fosse dirigida a Janja ou a qualquer mulher da esquerda, o vídeo já estaria fora do ar e a autora [punida]”, escreveu o perfil no X.
Essa percepção reflete a polarização política que marca o debate sobre regulação digital no Brasil, onde decisões judiciais são frequentemente interpretadas como tendenciosas por diferentes grupos ideológicos.
Por outro lado, apoiadores do governo Lula celebraram a decisão como uma vitória da liberdade de expressão. Perfis de apoio destacaram que a Justiça indeferiu o pedido de Michelle “alegando liberdade de expressão”, reforçando a narrativa de que a ex-primeira-dama não conseguiu “censurar” o vídeo da comunicadora Teônia Pereira.
A decisão foi vista como um respaldo aos princípios constitucionais que protegem o direito de crítica, especialmente contra figuras públicas.
O papel do STF e a teoria da Proteção Débil
A decisão do juiz da 1ª Vara Cível de Brasília está alinhada com a interpretação do STF sobre a liberdade de expressão. Em julgamentos recentes, como o que envolveu a regulação das redes sociais, ministros como Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso defenderam que a liberdade de expressão não é absoluta e deve ser equilibrada com outros direitos fundamentais, como a dignidade humana e a proteção contra discursos de ódio. Moraes, por exemplo, afirmou que “a liberdade de expressão não pode ser usada como escudo protetivo para prática de atividades ilícitas”. No entanto, no caso de Michelle, a Justiça entendeu que a permanência do vídeo não justificava uma intervenção liminar, já que o conteúdo, embora ofensivo, não se enquadrava em categorias como incitação à violência ou discurso de ódio que exigem remoção imediata.
A teoria da proteção débil do homem público, citada na decisão, é um conceito jurídico que reconhece que figuras públicas estão mais expostas a críticas e têm menos proteção contra ofensas à honra, desde que estas não configurem crimes graves. Essa abordagem busca garantir que o debate público seja amplo e plural, mesmo que isso implique em críticas duras ou desconfortáveis para autoridades. No caso de Michelle Bolsonaro, o juiz considerou que a ex-primeira-dama, por sua relevância política, está sujeita a esse escrutínio público, o que justificou a manutenção do vídeo no Instagram.
Implicações e o futuro do caso
A decisão de manter o vídeo no ar não encerra o caso. Como destacado pelo juiz, o mérito ainda será julgado, o que pode resultar em consequências para Teônia Pereira, como a obrigação de se retratar ou pagar indenização. Além disso, o caso ilustra os desafios de equilibrar liberdade de expressão e proteção à honra em um ambiente digital onde conteúdos se disseminam rapidamente. A regulação das redes sociais, intensificada pela decisão do STF em junho de 2025, coloca plataformas como o Instagram em uma posição de maior responsabilidade, mas também gera temores de censura preventiva, como alertou o deputado Coronel David (PL). Ele argumentou que a possibilidade de punição sem ordem judicial pode levar plataformas a remover conteúdos legítimos por medo de sanções, afetando o debate democrático.
O caso também ocorre em um contexto pré-eleitoral, às vésperas das eleições de 2026, o que aumenta a sensibilidade do tema. Juristas como André Marsiglia, especialista em liberdade de expressão, criticam a atuação do STF, argumentando que a regulação das redes deveria ser competência do Congresso Nacional, com amplo debate público, e não do Judiciário. A ausência de uma legislação específica aprovada pelo Legislativo, como o Projeto de Lei das Fake News (PL 2630/2020), que segue parado, reforça a percepção de que o STF está assumindo um papel legislativo, o que gera controvérsias sobre a separação de poderes.
A decisão da Justiça do Distrito Federal de negar o pedido de Michelle Bolsonaro para remover o vídeo do Instagram reforça a prioridade dada à liberdade de expressão no Brasil, especialmente em casos envolvendo figuras públicas. Ao citar precedentes do STF e a teoria da proteção débil, o juiz sinalizou que a ex-primeira-dama, por sua relevância política, está sujeita a críticas, mesmo que ofensivas, desde que não configurem crimes graves. O caso, que ainda terá seu mérito julgado, reflete as tensões entre liberdade de expressão, regulação das redes sociais e proteção à honra, em um cenário de polarização política e decisões judiciais que moldam o ambiente digital brasileiro.
Enquanto o STF avança na regulamentação das plataformas, o debate sobre quem deve definir os limites do discurso online – o Judiciário ou o Legislativo – permanece aberto, com implicações para a democracia e o futuro das eleições no país.
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