Defesa de Bolsonaro espelha estratégia que libertou Lula ao contestar investigação sobre tentativa de golpe
Advogados do ex-presidente apontam semelhanças entre métodos da PGR e práticas contestadas da Lava Jato, usando precedentes que beneficiaram atual presidente
Em uma estratégica manobra jurídica, a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma manifestação de 129 páginas que estabelece paralelos significativos entre os métodos investigativos atuais e as práticas controversas da operação Lava Jato. O documento, protocolado na quinta-feira (6), evita mencionar diretamente a operação que um dia foi celebrada por Bolsonaro, mas apropria-se dos mesmos argumentos que serviram para anular as condenações do presidente Lula.
A equipe jurídica, liderada pelo advogado Celso Vilardi, concentrou suas críticas em três pontos principais:
Questionamento da imparcialidade: A defesa argumenta que o ministro Alexandre de Moraes, ao participar dos interrogatórios da delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, estaria comprometendo sua imparcialidade como relator. Para fundamentar essa posição, citam o precedente estabelecido no caso de Sergio Moro, declarado parcial pelo STF no processo contra Lula.
"Document dump": Os advogados denunciam a prática de "despejo de documentos", apontando que a denúncia da PGR incluiu 81 mil páginas de provas sem indexação adequada, dificultando o exercício do direito de defesa.
"Fishing expedition": A defesa acusa os investigadores de realizarem uma "pesca probatória" - investigação sem foco definido com o objetivo de encontrar elementos para sustentar uma acusação previamente estabelecida.
Em uma ironia do destino político, Bolsonaro recorre agora aos mesmos argumentos que beneficiaram seu principal adversário político. O ex-presidente enfrenta situação similar à vivida por Lula durante a Lava Jato: está denunciado e inelegível, com possibilidade de prisão caso seja condenado ao final do processo.
A estratégia da defesa ganha contornos ainda mais interessantes considerando que um dos ministros que julgará o caso é justamente Cristiano Zanin, ex-advogado de Lula na Lava Jato e responsável pela construção de parte significativa da jurisprudência agora invocada pela defesa de Bolsonaro.
Para fundamentar seus argumentos, os advogados citaram inclusive uma decisão emblemática do ministro Gilmar Mendes sobre a necessidade de separação entre as funções de investigar, acusar e julgar, princípio que teria sido violado no atual processo.
O caso representa uma notável reviravolta na postura de Bolsonaro em relação aos métodos investigativos que antes apoiava. Durante o auge da Lava Jato, o ex-presidente não apenas elogiava a operação como também chegou a nomear Sergio Moro como seu Ministro da Justiça - relação que posteriormente se deteriorou, embora Bolsonaro tenha mantido seu apoio público à operação até seu eventual desmantelamento.
A manifestação da defesa será analisada pelo STF, onde a expectativa, segundo fontes do tribunal, é de que o ex-presidente seja condenado ao final do processo. O caso promete novos capítulos na complexa trama que entrelaça as histórias de dois dos principais antagonistas da política brasileira recente.