Candidatas de São Miguel do Guaporé escapam de cassação por falha processual
Decisão do TRE-RO anula ação contra vereadores do Democracia Cristã acusados de fraude à cota de gênero, destacando a importância das regras processuais nas disputas eleitorais
Em uma reviravolta jurídica que reforça a complexidade das normas eleitorais, o Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia (TRE-RO) decidiu, de forma unânime, anular a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) nº 0600429-49.2024.6.22.0035, movida pelo Partido dos Trabalhadores (PT) contra vereadores eleitos e suplentes do Democracia Cristã (DC) em São Miguel do Guaporé.
A acusação girava em torno de suposta fraude à cota de gênero, com a alegação de que o DC teria lançado candidatas "laranjas" nas eleições municipais. A decisão, proferida no âmbito do Mandado de Segurança nº 0600500-59.2024.6.22.0000, foi publicada em 2024 e destaca a relevância de aspectos formais no jogo político-eleitoral.
O caso: acusação de candidaturas fictícias
A ação inicial, proposta pelo Diretório Municipal do PT em São Miguel do Guaporé, acusava o Democracia Cristã de descumprir a cota de gênero, exigência legal que determina que pelo menos 30% das candidaturas de um partido ou coligação sejam de um mesmo gênero. Segundo o PT, o DC teria registrado quatro candidatas que, na prática, não participaram ativamente do processo eleitoral. As candidatas obtiveram votação inexpressiva, com resultados variando entre 3 e 5 votos cada, e não teriam realizado campanha ou movimentado recursos financeiros, o que levantou suspeitas de candidaturas fictícias. Esse tipo de prática, conforme jurisprudência consolidada do TRE-RO e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pode configurar fraude, levando à cassação de toda a chapa proporcional do partido.
A cota de gênero é uma medida instituída para promover a equidade na representação política, especialmente incentivando a participação feminina. No entanto, casos de candidaturas "laranjas" – em que mulheres são registradas apenas para cumprir a cota, sem real intenção de concorrer – têm sido alvo de ações judiciais em todo o Brasil. Em São Miguel do Guaporé, o PT argumentava que o DC teria utilizado esse artifício para viabilizar a chapa, comprometendo a legitimidade do processo eleitoral.
A defesa: uma questão de legitimidade processual
A defesa das candidatas, conduzida pelo advogado Nelson Canedo, não entrou no mérito das acusações de fraude, mas focou em uma questão processual: a ilegitimidade do PT para propor a ação de forma isolada. As candidatas alegaram que, por fazer parte da Federação Brasil da Esperança (FE BRASIL), composta por PT, PCdoB e PV, o partido não poderia atuar sozinho em uma ação judicial eleitoral. Segundo a defesa, a Resolução TSE nº 23.670/2021 determina que federações partidárias devem agir como um ente único perante a Justiça Eleitoral, especialmente em processos relacionados a eleições, como a AIJE.
O juiz da 35ª Zona Eleitoral de São Miguel do Guaporé indeferiu inicialmente essa tese, mantendo a tramitação da AIJE. Inconformadas, as candidatas recorreram ao TRE-RO por meio de um mandado de segurança, solicitando a extinção da ação por falha processual. O argumento central era que a ausência da FE BRASIL como autora da ação tornava o PT, isoladamente, desprovido de legitimidade ativa para o processo.
A decisão do TRE-RO: o peso das formalidades
Ao analisar o Mandado de Segurança, o TRE-RO acolheu a tese da defesa, decidindo pela extinção da AIJE. O tribunal entendeu que, ao integrar uma federação partidária, o PT deveria ter ajuizado a ação em conjunto com os demais partidos da FE BRASIL (PCdoB e PV). A atuação isolada do PT violou as normas que regem as federações partidárias, que, segundo a resolução do TSE, funcionam como uma entidade única durante o processo eleitoral. A decisão foi unânime e reforça a jurisprudência do TSE, que tem exigido maior rigor na observância das regras processuais em ações eleitorais.
Essa não é a primeira vez que questões processuais derrubam ações eleitorais no Brasil. Em casos semelhantes, o TSE já decidiu que a legitimidade ativa de partidos em federações deve ser exercida de forma conjunta, sob pena de extinção do processo. A decisão do TRE-RO em São Miguel do Guaporé segue essa linha, destacando que falhas formais podem ser tão determinantes quanto o mérito das acusações.
Repercussão e contexto político
A decisão do TRE-RO gerou debates no cenário político de Rondônia, especialmente em São Miguel do Guaporé, onde as eleições municipais são marcadas por intensa disputa entre as legendas. Embora a ação tenha sido extinta por motivos processuais, as acusações de fraude à cota de gênero permanecem sem julgamento de mérito, deixando questionamentos sobre a conduta do DC na formação de sua chapa. A extinção da AIJE evita, por ora, a cassação dos vereadores eleitos e suplentes do partido, mas reacende discussões sobre a efetividade das cotas de gênero e os mecanismos de fiscalização eleitoral.
No contexto nacional, o combate às candidaturas laranjas tem sido uma prioridade da Justiça Eleitoral. Em 2020, por exemplo, o TSE cassou chapas inteiras em cidades como Goiânia (GO) devido a fraudes à cota de gênero, o que resultou na perda de mandatos e na recontagem de votos. Casos como o de São Miguel do Guaporé mostram que, apesar dos avanços, ainda há desafios na garantia de uma aplicação rigorosa da legislação eleitoral.
O que vem a seguir?
Embora a decisão do TRE-RO represente uma vitória para os vereadores do DC, o caso ainda pode ter desdobramentos. A FE BRASIL, agora legitimada como autora, poderia, em tese, ingressar com nova ação, desde que respeitadas as formalidades processuais. No entanto, prazos eleitorais e o princípio da celeridade processual podem limitar essa possibilidade. Além disso, a decisão reforça a necessidade de partidos e federações estarem atentos às regras processuais, que se tornaram tão estratégicas quanto as campanhas eleitorais em si.
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