Ação de Rondônia no STF contra norma de São Paulo: Disputa fiscal ameaça equilíbrio federativo
Governador questiona decreto paulista que limita incentivos fiscais à Área de Livre Comércio de Guajará-Mirim, e pede intervenção do STF para proteger o pacto federativo e a economia local
O governador de Rondônia, Marcos Rocha, deu entrada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7822 no Supremo Tribunal Federal (STF), com pedido de liminar, contra o Decreto estadual 65.255/2020 do Estado de São Paulo. A norma, segundo Rocha, limita de forma unilateral a vigência de incentivos fiscais concedidos pelo Convênio ICMS 52/1992, que beneficia a Área de Livre Comércio de Guajará-Mirim, em Rondônia, com isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para produtos de origem nacional destinados à comercialização ou industrialização na região.
A ação, distribuída à ministra Cármen Lúcia, coloca em xeque a compatibilidade do decreto paulista com o equilíbrio federativo e reacende o debate sobre a chamada “guerra fiscal” entre estados brasileiros.
O contexto da disputa
A Área de Livre Comércio de Guajará-Mirim, criada para fomentar o desenvolvimento econômico em uma região de fronteira, depende de incentivos fiscais para atrair investimentos e promover atividades comerciais. O Convênio ICMS 52/1992, firmado no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), estabelece a isenção de ICMS nas operações de saída de mercadorias de outros estados, como São Paulo, para áreas de livre comércio, incluindo Guajará-Mirim.
No entanto, o Decreto 65.255/2020, editado pelo governo paulista, fixou um prazo final para essa isenção, estipulando sua validade até 31 de dezembro de 2024. Essa medida, segundo a argumentação de Rondônia, contraria o pacto federativo e compromete a economia local.
Marcos Rocha alega que a decisão de São Paulo, tomada sem o consenso dos demais estados no Confaz, configura uma prática de guerra fiscal, termo usado para descrever a competição entre entes federativos por meio de benefícios tributários que prejudicam a harmonia fiscal do país. A limitação imposta pelo decreto paulista implica a cobrança de ICMS nas operações destinadas à Guajará-Mirim, o que, na visão do governador, desestimula a atividade econômica na região e desrespeita as particularidades regionais, especialmente as desigualdades socioeconômicas do Norte brasileiro.
A argumentação jurídica
Na ADI 7822, o governo de Rondônia sustenta que o decreto de São Paulo viola dispositivos constitucionais, como o artigo 155, § 2º, inciso XII, alínea “g”, da Constituição Federal, que exige deliberação conjunta dos estados e do Distrito Federal, por meio de convênios no âmbito do Confaz, para a concessão ou revogação de benefícios fiscais relacionados ao ICMS. A norma paulista, ao limitar unilateralmente a isenção, descumpriria essa exigência, configurando uma afronta ao pacto federativo, previsto no artigo 1º da Constituição, e ao princípio da igualdade entre os entes da Federação.
Além disso, Rocha cita precedentes do STF que reforçam a necessidade de consenso no Confaz para alterações em benefícios fiscais. Um exemplo é a ADI 310/AM, relatada pela própria ministra Cármen Lúcia, que declarou a inconstitucionalidade de convênios que revogavam benefícios fiscais à Zona Franca de Manaus sem observar as normas constitucionais. Outro precedente mencionado é a ADI 3794/PR, que julgou inconstitucionais dispositivos de lei estadual por concederem benefícios fiscais sem respaldo em convênio interestadual. Esses julgados reforçam a tese de que decisões unilaterais em matéria de ICMS são inconstitucionais, pois desrespeitam o equilíbrio fiscal entre os estados.
Impactos na economia de Guajará-Mirim
A Área de Livre Comércio de Guajará-Mirim, localizada na fronteira com a Bolívia, é uma iniciativa estratégica para promover o desenvolvimento econômico em uma região marcada por desafios logísticos e socioeconômicos. A isenção de ICMS para mercadorias destinadas à comercialização ou industrialização na área é um dos principais atrativos para empresas que operam no local. A limitação imposta pelo decreto paulista, segundo o governo de Rondônia, pode comprometer a competitividade da região, reduzindo investimentos e empregos.
Em entrevista recente ao portal G1 Rondônia, o governador Marcos Rocha destacou que a medida de São Paulo afeta diretamente a economia local, especialmente os pequenos comerciantes e indústrias que dependem dos benefícios fiscais para operar. “Guajará-Mirim precisa desses incentivos para crescer e se desenvolver. A decisão de São Paulo, sem diálogo com os outros estados, prejudica não só Rondônia, mas o equilíbrio do pacto federativo”, afirmou. A ação também ganhou destaque em postagens no X, onde a TV Justiça informou sobre o ajuizamento da ADI, reforçando a relevância do tema para o debate nacional.
A posição do STF e o papel de Cármen Lúcia
A relatora da ADI 7822, ministra Cármen Lúcia, requisitou informações ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, para que ele preste esclarecimentos sobre o decreto. Esse procedimento é comum em ações diretas de inconstitucionalidade, permitindo que o STF avalie os argumentos de ambas as partes antes de decidir sobre a concessão da liminar ou o julgamento do mérito. A ministra tem um histórico de decisões firmes em casos envolvendo guerra fiscal, como na ADI 310/AM, onde defendeu a proteção aos incentivos fiscais da Zona Franca de Manaus, e na ADI 6278/DF, em que reforçou a necessidade de consenso no Confaz para benefícios tributários.
O STF tem se posicionado consistentemente contra práticas que desrespeitem o pacto federativo. Em 2020, por exemplo, a Corte, por maioria, manteve a validade da Lei Complementar 24/75, que exige decisão unânime dos estados no Confaz para a concessão de benefícios fiscais de ICMS. A decisão, relatada por Cármen Lúcia, destacou que a exigência de consenso é um mecanismo para evitar a guerra fiscal e garantir o equilíbrio entre os entes federativos.
Repercussão e expectativas
A ADI 7822 reacende o debate sobre a guerra fiscal no Brasil, um problema que há décadas opõe estados em busca de atrair investimentos por meio de benefícios tributários. Especialistas em direito tributário, como o advogado Eduardo Maneira, entrevistado pelo jornal Valor Econômico, apontam que decisões unilaterais, como a de São Paulo, podem gerar insegurança jurídica e prejudicar a cooperação federativa. “O STF tem um papel crucial em arbitrar esses conflitos, garantindo que as regras constitucionais sejam respeitadas”, afirmou Maneira.
Enquanto o Supremo não decide, a ação de Rondônia tem gerado discussões em fóruns regionais, como o Conselho de Desenvolvimento do Estado de Rondônia (Conder), que vê na manutenção dos incentivos fiscais uma condição essencial para o crescimento econômico de Guajará-Mirim. A expectativa é que o STF, ao julgar a ADI, reafirme a necessidade de diálogo entre os estados para evitar práticas que desestabilizem o pacto federativo.
Conclusão
A ADI 7822, movida por Rondônia contra São Paulo, é mais do que uma disputa tributária: ela reflete os desafios do federalismo brasileiro em equilibrar interesses regionais e a harmonia fiscal nacional. A decisão do STF, sob a relatoria de Cármen Lúcia, será determinante para definir os limites da autonomia dos estados em matéria de ICMS e proteger áreas estratégicas como a de Guajará-Mirim. Até lá, a ação mantém acesa a discussão sobre como conciliar desenvolvimento regional e cooperação federativa em um país marcado por desigualdades.
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